quinta-feira, 4 de março de 2010

Nota do Valor Econômico (confirmando meu último artigo)

Juro real no país é o mais alto do mundo

Luiz Sérgio Guimarães, de São Paulo

A taxa projetada para 12 meses está em 6% e supera a da Indonésia, de 3,6%, e da China, de 3,3%

Às vésperas do início de mais um ciclo de alta do juro básico pelo Banco Central - o quarto do governo Lula -, a taxa real brasileira voltou a ser a maior do mundo. A taxa projetada para 12 meses está em 6% e, de acordo com ranking da consultoria UP Trend, ela supera a da Indonésia, de 3,6%, e da China, de 3,3%. As indicações são de que o BC pode elevar aos poucos a Selic, dos atuais 8,75% para 11,25% até o fim do ano. Isso dá um juro real de 6,46% - ainda alto, mas bem distante das taxas históricas, como a média de 10% praticada entre 1999 e 2007.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Dilemas de um BC Adolescente

No início do mês, os brasileiros testemunharam mais um embate público entre o presidente do BC, Henrique Meireles, e o Ministro da Fazenda, Guido Mantega. Em discussão: a necessidade ou não de se aumentar os juros no país.

Após anos de inflação descontrolada, disfunção econômica que foi sanada pelo Plano Real, o brasileiro ficou um tanto traumatizado. Desde então, a cada soluço inflacionário, instaura-se o pânico. Ocorre que o quadro inflacionário pré FHC não tinha nada em comum com o atual. Naqueles tempos, a inflação era resultado do total descontrole dos gastos públicos, aliado a perversos mecanismos de indexação que ocasionavam a chamada inflação inercial. Em termos mais simples, a taxa de inflação se repetia mês após mês, em função de reajustes de preços baseados na inflação passada, e o quadro ia se deteriorando em decorrência de crescentes déficits do setor público.

Hoje, os mecanismos de indexação, embora ainda presentes, têm um potencial inercial bastante limitado. Os gastos públicos, por outro lado, a despeito dos desmandos e da gastança do atual governo, são controlados pela lei de responsabilidade fiscal, e não têm similaridade com o que ocorria naqueles tempos. Dessa forma, embora tenha simpatia pelas teorias econômicas mais ortodoxas, sou forçado a tomar o partido do Ministro da Fazenda nessa matéria, e reforçar o coro dos que dizem NÃO ao aumento dos juros.

E é preciso refletir: (i) dado que estamos lidando com uma inflação de consumo, o aumento da taxa de juros teria efeito direto sobre o mesmo? (ii) haveria efeitos colaterais indesejáveis?
Com relação à primeira questão, se perguntarmos ao consumidor brasileiro típico se ele sabe qual a taxa de juros embutida em suas compras a prazo, provavelmente a resposta será não, sendo que o que realmente importa é se a prestação cabe no seu bolso. Dessa forma, o aumento dos juros teria efeitos diretos limitados sobre o consumo.

No que tange à questão dos efeitos colaterais, primeiro, juros mais altos reduziriam fortemente o investimento produtivo (aí sim afetando o consumo, mas de maneira perversa), único meio de se dar sustentabilidade ao aumento do consumo no longo prazo, sem que haja inflação. Segundo, dado que o pagamento de juros é parte integrante dos gastos públicos, o aumento dessa conta reduziria diretamente a capacidade de investimento do governo em infra-estrutura, necessária para viabilizar os investimentos produtivos do setor privado.

Por fim, devemos atentar para o fato de que a taxa de juros brasileira ainda é a maior do mundo em termos reais. Ora, se as condições fiscais do país são boas (mesmo que não ideais), a simples manutenção da maior taxa de juros do mundo já teria o efeito restritivo desejado pela autoridade monetária, sendo um absurdo pensar em aumentá-la.

Medidas já em curso, como o aumento do recolhimento compulsório sobre depósitos a vista, e a descontinuação de algumas das renúncias fiscais feitas pela Fazenda no ano passado, acertariam o alvo, e seriam medidas menos danosas para a economia. No entanto, creio que a medida mais apropriada e eficaz seria o aumento do IOF sobre o crédito ao consumidor.

Considerada tal abundância de argumentos, me pergunto se essa discussão toda não teria mais a ver com a necessidade do BC de se afirmar como independente, do que com a política monetária em si.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Lula e a Caixa Preta do BC

1a edição

Quantas vezes escutamos o presidente, antes de eleito, referindo-se à “caixa preta do Banco Central”, numa alusão a nossa inexplicável taxa de juros doméstica? Seis anos depois de eleito, a caixa continua tão preta quanto antes! E agora, não é só a caixa, mas a situação mundial também.

A despeito da necessidade imediata de investimentos para que se evite uma recessão, o mercado espera corte de míseros 0,5% na Selic essa semana, e de 2,5% em 2009, levando a taxa básica a 11.25% no final do ano. Não se sabe o futuro, mas a taxa atual é simplesmente a maior do mundo! Ora, confesso que gostaria de ouvir do presidente os motivos para tal exorbitância.

O Brasil apresenta condições sólidas para redução dos juros domésticos: demanda controlada, superávit primário, superávit comercial e reservas internacionais vultosas. A desculpa tem sido, sistematicamente, a meta de inflação. Agora, entretanto, com a recessão à porta, seria de se esperar um corte grande e rápido. Não sei qual a magnitude ideal, mas certamente algo bem mais arrojado do que o projetado pelo mercado.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

O que você faria com R$ 615,00 mensais? (Pensamentos)

(1a edição)

O Orçamento Geral da União de 2008 foi de nada menos que 1,4 trilhão de reais. Em relação ao PIB, esse percentual chega aos assustadores 54%. Mas a conta que mais assusta é quando dividimos essa quantia astronômica pelo número de cidadãos brasileiros. Pasmem mas, por mês, o governo gasta o equivalente a 615 reais por habitante (190 milhões de habitantes). Mas espera aí um pouco... Já pensou se cada brasileiro recebesse, só do estado, 615 reais por mês? Será que ainda precisaríamos dos serviços prestados por ele? Essa questão me fez repensar completamente o papel do estado nas sociedades modernas.

Enquanto o governo Lula discute se as reservas do pré-sal serão administradas pela Petrobras ou por uma nova estatal a ser criada (que não se reporte a nenhum acionista privado, de preferência), aumenta continuamente a carga tributária e reluta em baixar os juros básicos da economia, crianças continuam a passar fome, o analfabetismo continua existindo e o estado da saúde pública continua precário. Será que extrair petróleo, aumentar a arrecadação e servir a dívida pública deveriam realmente ser as maiores preocupações do estado? Ora, ora, ora..., me parece que perdemos completamente a noção de para que serve o estado nacional constituído em primeira instância...

Na realidade, muitos pontos de vista existem sobre a questão do papel do estado, mas, se olharmos para as sociedades mais primitivas, antes mesmo da formalização dos estados como tal, poderemos identificar as necessidades humanas que levaram a sua criação. Essas necessidades primordiais são a razão de ser legítima do estado, sendo suas demais funções supérfluas e derivadas do agigantamento da máquina pública. Ademais, essas funções extra atendem, via de regra, muito mais a interesses particulares do que a interesses públicos.

Voltando à questão das sociedades primitivas, veremos que as tribos indígenas, por exemplo, tinham dois propósitos principais: segurança e apoio à subsistência. Dessa forma, se fizermos um paralelo com o estado moderno, podemos dizer que ele deve também atender, em primeiro lugar, a essas duas demandas sociais, quais sejam: garantir a segurança e viabilizar o suprimento das necessidades básicas dos seus cidadãos.

Falar em segurança significa falar em defesa contra inimigos externos (outros países) e internos (bandidos, desordeiros, etc.) e no estabelecimento e observância do cumprimento de regras de convívio uniformes. Já as necessidades básicas englobam coisas elementares à vida digna como saneamento básico, água, energia elétrica, moradia, alimentação, vestuário, transporte, saúde e educação. No que tange às necessidades básicas, entretanto, ressalte-se que supri-las não significa financia-las completamente, mas viabilizar que todos os cidadãos tenham a possibilidade de tê-las atendidas.

De volta às questões práticas, vejamos o que uma família de classe E poderia fazer com 615 reais por mês (por membro)... Suponhamos que essa família seja composta de um casal, ambos ganhando salário mínimo, e dois filhos em idade escolar, portanto sem renda. A renda mensal dessa família seria, portanto, de 3.290 reais ((2 x 415 reais) + (4 x 615 reais)).

Vejamos abaixo uma estimativa de orçamento familiar mensal, supondo que nenhum serviço seja prestado ou subsidiado pelo estado:

Total das receitas 3.290,00

Alimentação (400,00)
Moradia (aluguel) (200,00)
Transporte (200,00)
Água, luz, saneamento e coleta de lixo (100,00)
Vestuário (100,00)
Escola particular p/ 2 crianças (600,00)
Plano de saúde para 4 pessoas (600,00)

Total das despesas (2.200,00)

Excedente para despesas extra, laser, etc. 1090,00

Como vemos, o orçamento seria extremamente viável, havendo espaço inclusive para redução da carga tributária. Além disso, observe-se que essa família de classe E poderia usufruir dos sistemas particulares tanto de saúde quanto de educação, cuja superioridade em relação aos sistemas públicos dispensa comentários.

Obviamente, um pequeno percentual da receita do estado deverá ser empregada na segurança, conforme acima definido, mas esse valor é imaterial e não distorce o raciocínio exposto.

Dessa forma, fica claramente demonstrado que o estado brasileiro teria plenas condições de complementar a renda familiar de modo a nada faltar a seus cidadãos. Pergunto então novamente: já pensou se cada brasileiro recebesse, só do estado, 615 reais por mês? Já pensou?

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

América Latina Surreal (Artigo)

(2a edição)

O trio formado por Hugo Chaves, Evo Morales e Rafael Corrêa parece saído de um quadro de Salvador Dali. O quarto mosqueteiro, Raul Castro, completa o cenário surrealista da política latino americana. Os discursos e, o que é pior, as atitudes desses equivocados trapalhões parecem pertencer ao período em que o muro de Berlim ainda estava intacto.

Quando, em 1989, iniciou-se o processo de abertura política e a derrubada dos regimes totalitários de esquerda do leste europeu, muitos chegaram a pensar que a humanidade estaria livre do flagelo do comunismo. Contudo, foram-se os regimes, mas permaneceram no homem os sentimentos de inveja, prepotência e intolerância que os geraram.

Passadas duas décadas da aparentemente definitiva derrocada desse equívoco histórico, parece que os partidários desses sentimentos estão tentando voltar à ativa. Assim sendo, sinto-me compelido a expressar alguns pontos de vista sobre os regimes comunistas e socialistas, de modo a modestamente auxiliar na prevenção de um eventual “canto do cisne” dessa aberração política e econômica na América Latina.

Não que eu acredite que sejam comunistas legítimos, ou que pretendam implantar uma ditadura do proletariado em seus países. Contudo, uma vez que seus discursos são de esquerda radical, receio que os esquerdistas revolucionários que sobraram por aí passem a apoiá-los e que isso nos leve ao recrudescimento de uma ideologia que já deveria estar sepultada há 20 anos.

Primeiramente, penso ser totalmente inviável a imposição, pelo estado, de qualquer regime político-econômico. Se tomarmos como exemplo o capitalismo, veremos que ele não foi idealizado e/ou imposto por um pensador ou por um grupo político. Seu surgimento e sua disseminação foram resultados de um processo natural de evolução do regime anterior, o mercantilismo, no sentido de atender a novas demandas da sociedade.

Já o comunismo e sua forma abrandada, o socialismo, foram fruto de elocubrações mentais de um senhor chamado Karl Marx e da ambição política de um grupo, liderado por um cidadão de nome Vladimir Lênin. Enquanto tal, não poderia funcionar, e desde o início esteve fadado ao fracasso, pois uma ou algumas mentes, por mais privilegiadas que sejam, jamais serão capazes de conceber de maneira completa e infalível um sistema político-econômico a ser imposto à humanidade.

Com esse argumento, não estou desmerecendo o trabalho dos teóricos, mas sim ressalvando que suas contribuições, embora muito importantes para a evolução da sociedade, devem ser vistas como contribuições marginais destinadas à efetivação de ajustes no sistema em vigor, e jamais como receitas para uma ruptura completa. Para citar um exemplo importante da falibilidade das teorias, analisemos o principal enunciado de Marx, de que “só o trabalho cria valor”, e vejamos se ele se sustenta quando posto a prova.

Suponhamos que há 100 operários em uma fábrica de cadeiras. Esses 100 homens são capazes de fabricar 1000 cadeiras por dia em um sistema de produção instalado nessa fábrica há décadas. Num determinado momento, um desses operários solicita uma reunião com o dono da empresa e sugere uma modificação na linha de produção para aumentar a produção para 1500 unidades/dia. Contudo, essa alteração demandaria um investimento significativo de capital e o fechamento temporário da fábrica por 6 meses... Ademais, para passar as informações técnicas, o operário demanda um percentual de 10% nos lucros extra da fábrica.

Após essa reunião, caberá ao empresário decidir pela implementação, ou não, da proposta efetuada pelo operário... Caso ele decida seguir adiante com o projeto, caberá a ele arcar com possíveis conseqüências negativas, inclusive de falência. Contudo, se a empreitada tiver sucesso, seus 100 operários terão um incremento em sua produtividade diária de 50%.

Ora, vejam que uma simples decisão de uma pessoa pode resultar num incremento extremamente significativo da produção absoluta de uma quantidade finita de homens/hora, e que esse incremento jamais seria viável simplesmente pelo aumento do empenho desses operários. Em outras palavras, a decisão de alocação de recursos também cria valor, e não apenas o trabalho, conforme afirma Marx, e o lucro seria então a remuneração do capitalista por essa criação de valor, e não uma expropriação do trabalhador pelo capitalista, como afirmam os marxistas.

Se aceitarmos os argumentos acima, teremos que encarar o fato de que milhões de pessoas foram executadas para a manutenção de um regime baseado em uma premissa que se mostrou falsa.

Na verdade, o que ocorreu na Rússia, berço da revolução comunista, foi um processo conservador, e não de vanguarda. Enquanto o mundo mudava de fato e o avanço do capitalismo criava o bem-estar econômico em muitos países, a Rússia mantinha em vigor o sistema político-econômico então vigente em seus domínios, apenas substituindo a família real pelo politburo, e perpetuando a servidão como relação de trabalho. Como qualquer processo conservador, estava destinado a se tornar anacrônico e ineficiente.

Todavia, se fizermos um exercício de projeção do horizonte histórico, acho sensato prever que sistemas com traços tanto do socialismo quanto do comunismo acabarão vindo a existir no futuro, mas de maneira orgânica e democrática, e não através de rupturas políticas.

Em outras palavras, e para esclarecer o que para muitos liberais pareceria a princípio uma heresia, penso que o capitalismo evoluirá, primeiro, para uma sociedade mais assistencialista, via redistribuição de riquezas no sentido de garantir necessidades básicas dos seres humanos como alimentação, moradia, vestimentas, saúde e educação. Num segundo momento, (note que a visualização dessa hipótese exige uma capacidade de abstração bastante elevada) penso que, em função do estado de abundância material que atingiremos, a sociedade se tornará menos focada na produção. Nesse momento, em que todos estarão materialmente satisfeitos, a propriedade perderá significativamente sua importância.

Até lá, entretanto, pediria aos 3 patetas + 1 que parassem de sonhar e voltassem à realidade.